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sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Perdidos entre Eros e Psiquê



A mitologia grega conta a história de Eros e Psiquê. Psiquê era uma linda jovem, a filha mais jovem do rei de Mileto, ela era tão bela que sua beleza fora comparada
à da própria Afrodite, que ofendida com isso manda seu filho Eros fazê-la se apaixonar pelo homem mais feio do seu reino como castigo. Contudo o jovem deus ao ver uma mulher de tão rara beleza é tomado de uma arrebatadora paixão e decide toma-la para si, mesmo contra a vontade de sua rancorosa mãe.
Eros a leva até seu palácio onde todos os seus desejos são satisfeitos, e toda a noite a vinha tomar em seus braços impondo como única condição que Psiquê jamais visse o seu rosto, pois quando ela fizesse isso o perderia pra sempre. Ao receber a visita de suas irmãs conta para suas irmãs o que lhe aconteceu, mostra a maravilhosa vida que levava e a advertência de Eros, elas por sua vez tomadas de inveja convencem a tola Psiquê a tentar ver o rosto do seu amante misterioso. Certa madrugada Psiquê acorda e descobre o rosto de Eros que assustado e muito decepcionado acorda e se vai levando consigo o castelo, os criados e tudo que seu amor proporcionara a Psiquê, que extremamente arrependida teve de passar as maiores dificuldades para reconquistar o seu amado.

Eros e Psiquê representam a dicotomia presente em todo ser humano, o eterno conflito entre emoção representado na lenda pelo jovem deus Eros, e a razão representada pela tola princesa Psiquê, já que a mente é o domínio da razão. Constantemente nos vemos diante de situações das mais diversas onde devemos tomar uma decisão e cada um desses elementos, Razão e Emoção tentam nos impelir, nos influenciar e assim decidir o rumo de nossas vidas.
Naturalmente nem sempre é fácil escolher entre usar a cabeça ou o coração na hora de decidirmos a nossa vida e ficamos perdidos entre Eros e Psiquê. Naturalmente existem pessoas que tem uma tendência natural para algum lado, contudo vivemos em meio a um equilíbrio tenso e optar só por um lado pode ser prejudicial. A pessoa emotiva demais tende a ser pouco racional e acaba se decepcionando muito, com isso muitas vezes decidem passar de um extremo ao outro e tornar-se egoísta.
Por outro lado aquele que é guiado por Psiquê tem medo do desconhecido, não se sente seguro se não é completamente dono da situação e o medo do “véu que cobre o rosto de Eros” o faz não conseguir viver todas as possibilidades com intensidade, torna-se uma pessoa infeliz e pode ser tentado a também ir para o outro extremo devorando a vida, “vivendo a mil por hora” e sendo displicente com aquilo que ele tem de mais precioso, o Dom da Vida.
Eu pessoalmente faço parte dos discípulos de Eros, geralmente sigo o meu coração no meu trato com as situações da vida, tenho uma tendência a confiar nas pessoas e me apego rápido. Sofri muito com isso e estive tentado a assim como tantos outros pular de um extremo ao outro, mas logo descobri que estava perdendo minha identidade e me tornando aquilo que sempre detestei. O melhor é reconhecer seus limites, tentar manter um equilíbrio mesmo que tenso para não ser mais um perdido entre Eros e Psiquê.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Existindo pelo Outro


Imagine se um dia você acorda e percebe que algo muito estranho acontece com você, as pessoas simplesmente não conseguem te ver. Você a princípio acha graça, afinal é uma oportunidade de dizer e fazer coisas que você sempre quis mas nunca teve coragem. O tempo passa e a sensação de graça vai aos poucos sendo substituída pelo desespero. Amigos, parentes, ninguém te vê, as pessoas passam por você na rua, esbarram em você mas simplesmente ignoram sua presença, você então toma ciência de um fato inesperado e assustador, você não existe.
Essa situação hipotética traz em si uma questão fundamental: O que nos faz existir? O que define a minha existência no mundo? No século XVII Descartes atrela a existência à razão e à capacidade de pensar: com o seu famoso argumento do cogito “Credo, Ergo Sum” (Penso, logo Existo), Descartes defende que o sujeito existia como coisa pensante, não precisando necessariamente que houvesse o reconhecimento de um terceiro para que essa Res Cogitam existisse.
Contudo como no exemplo citado acima, o simples fato de pensarmos, sermos seres dotados de razão não nos faz existir, pelo menos não de forma plena. Somos seres sociais e a nossa existência plena só se dá quando somos reconhecidos pelo outro. Hegel filósofo alemão do século XIX defendeu essa hipótese, que em minha opinião é a mais acertada. Como no exemplo acima o indivíduo passou a não existir pra mais ninguém a não ser para ele mesmo, já que não era visto ou reconhecido pelo próximo, estava assim condenado ao esquecimento.

Nossa sociedade egoísta e individualista deve se lembrar disso: não podemos existir apenas pra nós mesmos, senão jamais existiremos de forma plena. Nós seres humanos nascemos para nos socializar-mos e só assim a nossa existência será reconhecida. Existir é essa relação dialética onde sou ao mesmo tempo sujeito e objeto, eu reconheço que exista um outro para que este outro ao ser reconhecido por mim também me reconheça, e isso reflete em todas as áreas de nossas vidas: no trabalho, nos afetos, enfim é necessário termos em mente que só existimos de verdade quando existimos para alguém além de nós mesmos.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

(Re)começar após o Caos

A mitologia Hindu tem entre o seu panteão de divindades uma bastante interessante a deusa Durga-Kali, considerada a Deusa da morte e da destruição, também é venerada como uma bondosa Mãe e mantenedora da vida por seus seguidores.

Os dias de Kali são dias onde a Deusa em sua forma vingadora destrói com os ímpios, os maus, o dia onde ela põe fim na maldade trazendo o castigo e o caos, contudo a fúria da grande mãe não é eterna, logo entra em cena Durga, a mantenedora da vida, daí tem-se um recomeço, começa-se outro ciclo de existência e a Vida volta a reinar.

Por trás deste interessante paradoxo que representa a dupla personalidade de Durga-Kali temos uma grande lição que a natureza nos dá e que podemos tirar grande proveito pras nossas vidas: às vezes para que algo inteiramente novo e melhor surja aquilo que é velho tem que ser completamente aniquilado. É necessário que o que é velho morra para que aquilo que é novo tenha espaço. Da mesma forma que se a semente não morrer não haverá flor, muitas vezes é necessário que passemos por situações das mais diversas onde nos vemos em meio ao Caos completo para que possamos chegar a um lugar melhor.

Contudo poucos conseguem enxergar no Caos uma possibilidade de recomeçar, preferem encarar as dificuldades e obstáculos que a vida nos impõe como uma barreira intransponível ao invés de olhá-las como uma chance de se tornar uma pessoa melhor e chagar a um lugar melhor. Os momentos fáceis da nossa vida nos dão descanso, mas é em meio ao Caos que a nossa força é realmente testada.
A mitologia hindu e a história de Durga-Kali nos trazem uma lição que a Natureza esfrega aos nossos olhos a todo o momento, estamos em eterno devir e o Caos é apenas uma etapa necessária em nossa caminhada para nos tornar-mos seres humanos melhores. Contudo o Caos não é eterno e como na história de Durga-Kali é possível recomeçar após o Caos.

domingo, 10 de outubro de 2010

Das diferentes formas de Amor



O que nós chamamos simplesmente de Amor, no original grego existem três vocábulos diferentes para distingui-lo.

 O primeiro é Eros, identificado com o amor carnal entre um homem e uma mulher, e suas variantes tais como: paixão, desejo, tesão e toda e qualquer forma de atração que predomine o físico. Essa forma está bastante em alta nos últimos tempos, reflexo de uma sociedade extremamente narcisista, individualista e hedonista que tem na busca da satisfação de seus prazeres o objetivo maior de sua infeliz existência. Geralmente relacionamentos baseados nessa forma de “amor” seja ele qual for tem pouca duração, já que na medida em que minhas necessidades de prazer não estão sendo correspondidas eu desisto e busco um outro objeto de prazer, afinal o que importa nessa forma não é o Nós, e sim o Eu, eu sou o todo e o outro tem como único objetivo me satisfazer, então me acostumo ao mesmo tempo usar e ser usado.

 A segunda é Philia, termo grego que é identificado com a amizade ou amor fraternal. Não se aplica a uma relação de troca de interesses ou favores, não vê a necessidade de ser sempre satisfeito em suas vontades, não necessita que o outro seja igual a ele, geralmente cresce nos momentos de maior crise e após a crise ser superada vê-se que o sentimento se solidificou. Um judeu muito sábio, o Rei Salomão referindo-se a essa forma de amor disse “Existem amigos melhores que irmãos”, e Davi, um dos maiores reis que Israel já teve, ao lamentar a morte de Jônatas, seu melhor amigo disse “ Jônatas, seu amor(philia) me era melhor que o amor(eros) das mulheres”.  Se fizermos uma escala de Sentimentos essa forma de Amor vai ser considerada mais sublime por muitos, ou quase todos, filósofos da antiguidade já que Eros está mais ligado aos sentidos sendo assim considerado mais “animal” que “racional.” 

A terceira e última delas é Ágape, a mais sublime de todas as três, é um amor tão forte que está identificado com o Divino. São Paulo ao falar do amor Ágape disse o seguinte: O amor (Ágape) é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece. Não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal; Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade; Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor  jamais acaba.”  Um amor que vê as necessidades do outro antes mesmo das suas, que está disposto a se sacrificar pelo bem do próximo, não apenas de conhecidos mas também de quem nunca se viu. Pouquíssimas pessoas na história foram capazes de demonstrar de forma, não digo plena pois a forma plena do Ágape é um atributo único do Divino, mas da forma mais ampla possível para um ser humano essa forma de amor. E essas pessoas foram marcos e exemploes até hoje, nomes como: S. Francisco de Assis, Madre Tereza de Calcutá, Gandhi, Sidarta Gautama e Jesus Cristo, independente do credo religioso, foram capazes de cada um ao seu próprio modo chegarem ao ponto de se aniquilarem a fim de verem o bem do próximo. Àqueles que dizem não ser possível ser diferente, nadar contra a maré viverem uma vida mais digna e se fazerem dignos do epítetos de humanos, estão aí esses seres que foram humanos como nós e escolheram viver um estilo de vida que o mais importante não é o que tenho e sim o que sou, não importa o que desfruto e sim o que posso doar pra fazer meu semelhante ter uma vida mais digna. Essas pessoas especiais estão aí como um convite e um desafio para sermos realmente humanos...

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Fragmentos

Uma das principais perguntas que nos fazemos o tempo todo é: o que somos realmente e por que somos assim? Qual seria o motivo que nos leva às vezes a agir sem pensar, de forma autônoma diante de determinadas situações? Porque penso de determinado jeito, enfim, o que me leva a ser exatamente como sou?  
Muitas pessoas tentaram, e ainda hoje tentam responder a essa pergunta. Entram em cena conceitos como essência, determinação social, e tantas outras coisas que tentam elucidar tal questão. Contudo tenho pra mim que somos feitos de fragmentos, como um grande mosaico. Tudo que vivemos, e o que já aconteceu mesmo antes de nós existirmos, tudo influi sobre nós e de alguma forma determina o que somos e as atitudes que tomaremos.
Contudo não precisamos necessariamente apenas um mero produto de nossa educação em casa, nos locais de socialização, não precisamos ser passivos diante dessa influência e dessa determinação. Podemos e devemos fazer nossas próprias escolhas, escolher nosso próprio caminho pois é isso que nos humaniza, o poder de agirmos contra os nossos instintos e tomarmos decisões pensadas...